CONDENADOS...
(para todos os trabalhadores desempregados)
© DE João Batista do Lago
Saio de casa nervoso!
Como um operário que vai ao primeiro emprego.
De minha casa até a parada de ônibus vou plantando na lavoura cerebral
Pensamentos sobre um salário imaginário:
“Agora terei dinheiro para meu próprio cigarro e
poderei comprar minha dose de pinga diária...
Agora as pessoas vão me olhar como um trabalhador e
Não como alguém que vive sob o manto sagrado da ‘mamãe’...
Serei respeitado como um cidadão de fato;
Não como um vagabundo que vive às custas da ‘mulé’...
Agora voltarei a estudar e
Vencerei na empresa e
Chegarei a uma diretoria...
Agora poderei ter uma namorada e
Sair com ela aos domingos e
Passear nos parques, e assistir a um filme num cinema do bairro
E almoçar num bom restaurante:
Desses que ficam na parte alta da cidade e
Mesmo que seja só pra impressionar minha amada,
Assim farei para que ela não pense noutro homem...
Agora...”
- Volto pra casa nervoso!
Como um operário desgraçado e sem sorte
Na minha cabeça o encanto de ficar estirado no asfalto
Depois de ter meu corpo destroçado pelos pneus
Da empresa que não me quis trabalhador,
Que me humilhou compulsoriamente a dias de esmolé,
Que me condenou à vergonha da não-cidadania...
- Volto pra casa nervoso!
Como um operário vencido e com medo de enfrentar a família:
De encarar a “mulé” e “fios”.
De saber que eles me tem por vencido,
Que sou um zero à esquerda,
Que já devia estar morto,
Que não merecia ser mais um fardo...
- Volto pra casa, enfim, amargurado!
Com gosto de fel na boca; boca que não tem direito à comida
Servida de suor da “mulé” e dos “fios”
Que me castigam com olhares a cada colherada engolida,
Que me açoitam com seus pensamentos escondidos,
Mas que reverberam no dorso da minh’alma
Estalando o chicote pia: “Vai trabalhar vagabundo”.
- No dia seguinte lá se me vou de novo
plantando na lavoura do meu cérebro pensamentos
dum homem capaz de ter um emprego...
E no final do dia retorno acabrunhado.
Derrotado pelo mercado que não me tem mais como força de trabalho:
- “Obrigado, moço, infelizmente já preenchemos a vaga...”
- Então volto pra casa e... No dia seguinte... Talvez!...
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