segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

OBLATAS

CANTO VIÉS

© De João Batista do Lago

Que adianta o lirismo,
Que adianta estética,
Que adianta o belo
Residente na poética?

Sim!
Que adianta tudo isso
Se a vida não é assim?

Foges pela tangente do real
Escapas pelos esgotos da beleza
Cegas-te para não enxergar a dureza
Cruel gerada na alma animal
Do homem que da vida é só vileza!

Oh, meu caro João, não me tome por mal;
Bem sei da beleza que na vida há. Bem sei!
E um dia hei-de a cantar nalgum verso toda essa beleza,
Mas agora é prudente falar da maldade que há
Instalada – em qualquer lugar – na beleza
Perdida no barro da criação.

- Não tenho dúvida, João, sou filho da indignação.

Que adianta cantar a esperança, se matam em mim a criança?
Que adianta cantar a paz, se me constroem soldado das guerras?
Que adianta cantar a vida, se dela não me há qualquer guarida?

Não. Não tenho por que sorrir…
Nem mesmo lágrimas me restaram para chorar.
Todo sorriso; toda lágrima
Restaram consumados na insensatez da próprio Ser.

Quero sim, à vida cantar!
Dizer dela toda beleza no plural e no singular:
A rosa, são rosas
A flor, são flores
O amor, são amores
Na dor, não há-de haver dores
Na fome, há-de haver todo alimento
No Ser, toda solidariedade
Da ação, nenhuma maldade

Quero, pois, assim,
Toda vida cantarolar.