A CEIA
© DE João Batista do Lago
Vindes. Ó criaturas do meu tempo! Vindes.
Vindes e sentai-vos comigo à mesa.
Chegada é a hora de saborear os mortos (e)
Beber o sangue defuntal dos nossos corpos.
Não temeis os sabores do que é vossos
Nenhuma dor será mais doce em vossas bocas
Nenhuma gota de sangue se esgotará...
Senteis ao meu lado – lado direito do pai!
E sem medos recebei o pedaço da carne
Matéria que vos ungireis entre anjos e demônios
Hóstia que vos transformareis em sagrados
Não temereis, pois, o beijo do escárnio
Saboreareis no altar das oliveiras
Da oliva mais pura o óleo da vida
Porém, ficai atentos, ó convivas deste prato
Comereis de todas as carnes e bebereis de todos os sangues
Contudo, nem mesmo isso vos garantireis a salvação
E quando estiverdes na soleira das tumbas
E quando sentirdes a dor de barriga das sombras
Há-de virdes o teu corpo enterrado
Alimentando todos os vermes da terra
Só então percebereis os sabores temperados
Que guardardes nos balaústres de todas as guerras
Para assim cozerdes os corações dos humanos
Só então sabereis da solidariedade defuntada
Da solidão macabra de todas vossas orações:
Tiranias que efetivaríeis entoando cânticos de louvores
Rasgando entre dentes todas as carnes das almas