sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

DIÁLOGO DO TEMPO E DO ESPAÇO

DIÁLOGO DO TEMPO E DO ESPAÇO

© De João Batista do Lago

Eu que não mais estou aqui
Aqui estou para agradecer
As mesuras das tuas palavras
Que nem foram escritas para ti
Mas para um tempo que já não há
Que muito distante está
- seja de mim; seja de ti.

Obrigado a você que me lê agora.
Confesso: gostaria de saber por quê comigo choras!
Estes lamentos descritos noutros tempos;
De aventuras e desventuras sem laços,
Duma alma que passou pela vida sem espaço,
Que nunca sentiu o frescor do próprio ungüento…
Por que merece, agora, roubar esse teu tempo?

Naquele tempo, ó meu caro viajor,
O mundo era um labirinto de dor.
Talvez por isso estranhes o langor da poesia
Reflexo do horror que havia em toda periferia
Macabra terra e residência da miserável guerra
Que nunca se dera a oferecer como anjo da paz
Que sempre se fizera de toda vida só quimera.

Sinto muito, meu caro. E como o sinto
Não poder dar-te outra imagem senão esta.
Bem gostaria de te falar de gloriosas festas…
Bem gostaria! Mas se assim fizesse
Não me restaria outro apelido: farsante!
Tomaste toda poesia para cantar o onirismo presente,
Porém esquecestes do real Ser, ser o principal ausente.

Quando vês que reclamo em mim a criança
Podes crer, estava sufocando sem o ar da esperança
Quando assistes ao meu lamento em pranto
Crê, era a presença do meu eterno (então) desencanto
Já tanto e quanto cansado do grito (sempre) sufocado
Pela cicuta-da-europa ou mesmo pela cicuta-do-norte,
Que me oprimia tanto e quanto até me levar à morte.

Se nessas páginas me vês (por vez) ensandecido
Era o grito mais profundo do ser em mim esquecido,
Era o choro sem lágrimas pelo canto varrido
Das almas penadas. Se me vês assim… Assim eu fora!
Uma voz ao vento feito relincho de jumento em cio
Louco para gerar no ventre do barro e da água
Toda lavoura que se pudera agasalhar a fome e o frio.

Sim, meu caro, sempre me fora assim: princípio, meio e fim.
Mas se princípio fora; meio não me fizera, não me contivera;
Do fim apenas me restara o sabor de nada entender…
E aí sepultado dentro do meu próprio ser
Embalsamado e esquecido na câmara sarcófica do não-Ser,
Trancado pela chave do sagrado na palavra mortal
Aprendera que todo sofrimento resulta do pensar animal.

É possível, sim; ser tudo mentira tudo o que falara.
É possível nem mesmo acreditar no mal que tanto e quanto causou.
Sim, tudo é possível, bem sei! Quem sabe fora apenas mentira!
Só não é possível esquecer que a vida de si esqueceu,
Que a tantos e quantos deu e a tantos e quantos roubou:
Uma rosa murchou; uma flor não floresceu. A vida morrera?
Mas nem mesmo isso regara o coração dos indulgentes.

Lê-me, então, ó viandante de todos os tempos;
Lê-me com os passos do pensamento de um romeiro contrito.
Mas, se porventura vês no meu escrito só dor e lamento
Rogo-te: tomas essa estética do sonho de um poeta maldito
Como a hóstia sagrada da realidade da vida, pois
Mesmo que ela te cause dor ou qualquer ferida
Há-de ser pela eternidade, não teu delito, mas o teu veredicto.

O SER DOS MEUS OLHOS










O SER DOS MEUS OLHOS

© De João Batista do Lago

Meus olhos seguem o ser que se esvai
No esfumacento entardecer
Onde irá o meu ser?
Que visões irão atravessar?
Onde irão os meus olhos?
Meu ser?
Quem sabe!
Eu não sei.
Amanhã, meus olhos já não mais seguirão ninguém
No escurecer da entardecer!
Onde estará meu ser?
Onde estarão meus olhos?
Quem sabe!
Quem soubera?
Quem saberá?

- Eu não sei.