quarta-feira, 30 de abril de 2008

SONETOS - LVIII (© (DE João Batista do Lago)

SONETOS

© (DE João Batista do Lago

LVIII

Canta minh’alma triste... Canta! Cant’os

Versos tristes minha solidão inglória

Navegante d’um mar vil e tormentoso.

Não me há-de sobrevir vida sem ti

Sou-me condenado, pobre, desditoso.

Náufrago solitário de vida errante;

Miserável viajor se não te sou amante.

Qu’interesse há desta vida agora

Sem os abraços e o calor do teu corpo quente?

Ah! Quanta saudade do tempo d’outrora

Quanta falta faz o teu beijo ardente.

Não me há maior castigo, nem desdita,

Teus olhos brilharem por figura maldita:

Prefiro morrer à vida de tão triste sorte.

sábado, 26 de abril de 2008

APAGOGIA (© DE João Batista do Lago)

APAGOGIA

© DE João Batista do Lago

Ora a minha solidão

No vazio inerte das igrejas

Busca encontrar na pedra sagrada

A hóstia já sangrada

Pelo vício da palavra.

O verbo está velho e cansado

Não mais atinge a essencialidade

A alma revoltada cancela o oratório

Feito de silêncios:

A pia batismal é seca e rachada.

Procura o confessionário perfeito

Contudo não encontra ouvidos atentos:

Ficaram surdos com a procissão dos gritos

Que soam das cavernas mais torpes

Ecos solenes que vagam nos tempos do Ser.

terça-feira, 22 de abril de 2008

O Fim do Homem (DE João Batista do Lago)

O Fim do Homem

© DE João Batista do Lago

Finda o Homem!

E finda na sua essencialidade

Quando atinge a capacidade

Do excesso...

E quando atinge a incapacidade

Da falta...

Finda pois, assim,

O Homem.

Nada mais há por Ser

Já que tudo existe no não-Ser.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Soneto Para Isabela (DE João Batista do Lago

SONETO PARA ISABELA

© DE João Batista do Lago

Dá-me o prazer desta valsa

Vem. O salão é todo nosso

Deixa qu’eu te enlace o dorso

Qu’eu me perca numa nota falsa

Dá-me por instante teu virgem corpo

Quero dele calor ardente nesta dança

E como se fosse boneca de criança

Deixa-me sentir as pétalas da tu’alma

Dizer a todos sem nada balbuciar:

És flor! És rosa que fecunda meu horto.

És vida! Enfim, minha falsa valsa de ninar.

Vem! Levanta desta tumba fria, vem!

Vem... Vês, a valsa já vai acabar...

Vem, ó Isabela, esta falsa valsa comigo dançar.

sábado, 19 de abril de 2008

CARNIFICENTE (DE João Batista do Lago)

CARNIFICENTE

© DE João Batista do Lago

Vem!

Rasga meu peito sem medo

Toma em tuas mãos meu coração (e)

Bebe todo o sangue...

Sangue que sangra como rio

Sangue que dá vida ao corpo frio (e)

Que se faz larva do fogo da paixão

Deixa-o correr por entre veias

Vazias.

Deixa-o lavar o esgoto

Deixa-o penetrar as profundezas

Do teu corpo-mar

Deixa-o, enfim, embriagar...

Até – (quem sabe!?) – que o doce tédio dos teus lábios

Alcance a sarjeta do verdugo (e)

Beije silenciosamente a terra que te é pó (mas)

Que nunca se dera como palavra – nem verbo!

E quando sóbrio te encontrares

Com o gosto do sangue à boca

Verás que tens por alimento

A desdita de ser o que nunca fostes

Sendo o que jamais serás

Na eternidade dos tempos – e das almas sem espírito:

Deus maldito que professo fogo

Planta fome (e)

Mergulha no mar de lama

Onde almas sem ser dançam a valsa apocalíptica num

Balé de águas que se vão e que se vêem

Sem jamais serem passageiras da mesma viagem

sábado, 5 de abril de 2008

Velejador [DE João Batista do Lago]

Veleja(dor)



© (DE João Batista do Lago)



sempre sempre

venho volto solto

no fato dos atos

sinto sinto sinto

desacatos velhacos

ser desprendido

rugindo vazio

calafrio

alma alma

nunca calma

depois da calma

gritos dores

silêncio

vazio...

velo velo

veleiro

sem leme

sem navegador

carregas dor

só dor

lamento do vento

sustento do ser

que não quer ser

ser ser ser

faca de dois gumes:

direito esquerdo esquerdo direito

mar de estrumes...

navego ego

cego cego cego

nau de loucos

mortos dos meus cemitérios

condenados todos

loucos loucos loucos

velejam rezas

procissões desejos

pesco versos inconfessos

diversos dispersos

mares de peixes perdidos

sepulcro do ser

ser não-ser ser

nasceres mal-resolvidos...

findo fim enfim

mal-resolvido:

ser não-ser ser não-ser

dizer o quê?

viver morrer:

não-ser ser não-ser ser

ondas sem volume

não-ser ser do lume

topo de águas

volume de mágoas

ser-me não-ser-me

navegante navegador navegado

singrante singrador singrado

mar sujeito desprendido