TERCETOS, NADA MAIS QUE TERCETOS
© DE João Batista do Lago
Aviso aos “haicaístas” de plantão: os versos abaixo não são, em hipóteses quaisquer, Haicai. Segundo a minha concepção são (e nada mais do que isso são) tercetos que fazem parte de um estudo poético que desenvolvo. Nestes tercetos introduzo práxis técnica e metodológica “metricamente” diferentes e contrários àqueles que são utilizados pelo haicai, ou seja, a construção do haicai compõe-se de três versos de dezessete sílabas: o primeiro e o terceiro versos são de cinco sílabas; o segundo de sete. Já nos tercetos que componho o primeiro e o terceiro versos são de sete sílabas e o segundo de cinco sílabas.
Outro aspecto que considero relevante destacar, para delimitar definitivamente a diferença dos tercetos que construo, reside no seguinte fato: o haicai, genericamente, deve concentrar pensamento poético e/ou filosófico inspirado nas mudanças que o ciclo das estações provoca no mundo concreto. Já os “meus” tercetos concentram pensamentos variados (p. ex.: filosofia, economia, sociologia, sociedade e comportamento social, religião, etc.) oriundos da concretitude do concreto da realidade, do real, da infra-estrutura (a partir de conceito filosófico marxista oriundo do “new criticism” da Escola de Frankfurt).
Para, além disso, devo destacar outro ponto que me distancia definitivamente da corrente haicaísta vernacular (até porque só entendo o haicai estruturado a partir da essencialidade vernáculo-epigramático japonês): cada vez mais a minha poética torna-se ôntico-ontológica e caminha no, assim, sentido de se amalgamar no conceito do Surracionalismo bachelardiano, sobretudo quando infere: “O exterior e o interior formam uma dialética de esquartejamento, e a geometria evidente dessa dialética nos cega tão logo a introduzimos em âmbitos metafóricos. Ela tem a nitidez crucial do ‘sim’ e do ‘não’, que tudo decide. Fazemos dela, sem o percebermos, uma base de imagem que comandam todos os pensamentos do positivo e do negativo. Os lógicos traçam círculos que se superpõem ou se excluem, e logo todas as suas regras se tornam claras. O filósofo, com o interior e o exterior, pensa o ser e o não-ser (o caso da ”minha” poética, especificamente). A metafísica mais profunda está assim enraizada numa geometria implícita, numa geometria que – queiram ou não – especializa o pensamento; se o metafísico não desenhasse, seria capaz de pensar? O aberto e o fechado são metáforas que se liga a tudo, até aos sistemas” – Gaston Bachelard in A Poética do Espaço, pp. 215 e 216.
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I
Como macho repetem
Elas são assim:
Feministas, competem.
II
O capital confesso:
Homem é peça.
O mercado professa.
III
Amor só é ilusão
Reduz todo ser
À miserável prisão
IV
O cigarro vem antes
O uísque depois
Amor de um não é dois
V
A vida: só um sonho
Simples ilusão
Espera nela ponho
VI
No amor a dominação
Plena sujeição!
No processo: produção
VII
Cantai à felicidade
Diz o profeta
Imita assim ao poeta
VIII
A palavra na arte
Lavra amor e dor
Colhe o fruto sofredor
IX
Fé remove montanha
Demove do homem
Fortaleza tamanha
X
Quem canta, males espanta!
Cantai aos prantos
Desespero vos encanta
XI
A paz da guerra salva
A guerra acalma
Todo poder sem alma
XII
Visitai sempre a alma
Ela é só calma
Na diversa confusão
XII
Corpo reflexo: tempo.
Mente reflete
Toda morte presente