sábado, 28 de fevereiro de 2009

SABBATH

SHABBATH

© DE João Batista do Lago

Porque hoje é sábado

Resolvi fazer uma limpeza e

Promover a ordem no

Caos do meu quarto

– minha concha! –

É lá o meu templo sagrado

A sacristia das minhas angústias

Residência dos meus devaneios

É lá o meu canto de intimidades

Onde moram meus armários

Cofres das minhas veleidades

E assim procedi

Pouco a pouco fui fazendo a faxina

E lentamente o quarto foi-me de novo sorrindo

Deixei que o Sol entrasse pela janela

Que banhasse com raios de luz

Toda imensidão da concha que me habita

Que me segreda como pérola

Mas que me oferta ao mundo

Como hóstia

Como oblação

Aos deuses que me crucificam

Após o Evangelho das

Sagradas escrituras dos mercados

Pouco a pouco o quarto foi se transformando

Pendurando em cada cruz minhas identidades

Então reféns das liberdades do movimento dos meus pensamentos

Antes libertinos e soltos e puros...

Foi então que ela apareceu

Estava ali parada à porta...

Inerte como o Juízo Final

Olhava-me com fixação nitrogenada

Fazendo-me crer que eu era sua obra prima

Na intuição do instante da sua criação mais-que-perfeita

Fazendo com que meu corpo assimilasse sua angústia

Ali estava ela parada... Estagnada mesmo

Sem uma palavra

Apenas com o olhar fixo duma pedinte

Que de tanta fome

De tanta sede

De tanta dor

De tanta angústia

Não mais tinha forças sequer para mendigar

Ali estava ela inerte como o Juízo Final

Resolvi então dela aproximar-me

Foi aí que percebi que ela estava perneta

E como quem sente vergonha de não ser completo

Baixou a cabeça e chorou...

Chorou o choro mais profundo que me correu entre as veias

Chorou o choro do prenúncio da morte

Chorou o cântico das súplicas

Duma súplica pela vida

Como quem sabia que sua etapa ainda não podia findar

Ajoelhei-me diante de tanta resignação

Diante de tanta e quanta submissão paciente aos sofrimentos da vida...

Foi aí que ela me falou sem dizer uma palavra:

“toma-me em tuas mãos e me levas ao alpendre da tua morada;

lá serei salva pelas flores e rosas e plantas;

lá serei parte da natureza;

e mesmo que morra e mesmo que desapareça

serei entre flores e rosas e plantas

a conjunção perfeita de toda sabedoria”

Tomei-a às mãos e a conduzi até o alpendre

Ela está salva

Ela está viva

Hoje posso dizer:

Do caos do meu quarto dei vida a uma Esperança

EU SIMBÓLICO

EU SIMBÓLICO

 

© DE João Batista do Lago

 

Resta-me da ossatura a

Carne de todos os símbolos

Perambulando entre os

Apriscos da floresta

Pictórica de muitas moradas

São meus alimentos os

Instintos selvagens dos

Instantes angustiados...

Sou fera rara! Tão rara

Quanto temporais de sonhos

A vida – minha catacumba! –

Encorpa minha alma de espíritos

Hora puros... Outras impuras

Sob o açoite de vergastas

Que me movem em direção aos nadas

Selo com meus símbolos a

Diáspora de todos os povos

Encarcerados nos andaimes dos

Caminhos para Babel:

No final da jornada não há céus

Todos os demônios unem-se

Numa desesperada oração onírica

E entoam hinos sufragantes

E choram choros lamuriantes

– gritos das minhas alcatéias! –

Oh! Sensações de ondas em espirais

Que me fazem vibrar no umbral de

Loucuras santas – tantas e quantas! –

Perdoa o corpo que te abriga as dores

Salva-o dos chicotes das representações

E me revelas o sonho real

Gerado nas profundezas da carne imaterial

É lá onde desejo ser toda Possibilidade dos

Sonhos mais sublimes e perfeitos e

Matizar minhas cores na ossatura do eterno

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

CAMINHARES

CAMINHARES

(dedico este poema,
in memoria,
ao poeta
José Nascimento de Moraes Filho,
que faleceu no último dia 21/02/2009)

© de João Batista do Lago

Não me queiras tu indicar-me caminhos,
Todos os traçaste com pés de porcos.
Não. Não queiras tu impor-me teus santos;
Teus cânones – pérolas que brotam das lamas –,
E se instalaram no sacrário na sacristia
Onde se rezam orações profanas ao
Deus dos mercados que te encanta...

“Não, eu não vou por aí”.
– já dissera um poeta Régio –,
Mas tu insistes com ar de vitória
Conquistada com o vintém dos bajuladores
Que tomam tua obra como hóstia sagrada
Para em seguida cagá-la no colo ilustre
Da tua bem-aventurada sapiência burocrática.

Afasta de mim o cálice das canonizações fáceis,
Não me pretendo entre mortos das velhas escolas
De sabedorias guardadas nos armários das velhacarias,
Donde soam vozes e signos dos vampiros
Que sugam a alma do povo trabalhador,
Vilmente esquecido pela tua ânsia de atingir estrelas
Com versos de galanteador.

Não. Não me convides para seguir este teu caminho...
Meus pés não suportariam os mármores da tua igreja!
Por certo me aleijariam... E sangrariam até a morte...
Prefiro o calvário da dor... E da fome... E da miséria,
Que o banquete da pajelança dos curadores e dos ímpios
Versejadores que desfilam na corte da ignomínia;
Que vendem sua alma ao diabo como anjos de sabedoria.

De que me adianta seguir o teu caminho,
Se nele apenas se compraz a reprodução do visível?
Não. Não pretendo seguir o teu caminho.
Prefiro dar visibilidade ao não visível,
Àquilo que se esconde por detrás do teu versejar,
Mesmo que me acuses de incompreensível
Meu desejo é rasgar o verbo até ele sangrar.

Este, sim! Este é o meu caminho.
E nada me fará mudar este destino
– de escrever no pergaminho da vida
a sólida robustez da miséria e da fome,
da insensatez do homem,
do deus perdido no aquário do ser,
do sujeito obra da natureza entre Deus e diabo.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

JOSÉ NASCIMENTO DE MORAES FILHO, MEU MESTRE E ÍCONE

Acabo de receber este e-mail dando-me conta do falecimento de uma das pessoas que me foram mais caras na vida, o Professor José Nacimento de Moraes Filho...

Estou pasmo!
Confesso que nem ser o dizer neste instante.
O professor Nascimento de Moraesfoi um ícone para mim. Se hoje sou poeta... O sou pelo muito que recebi dele, sobretudo o incentivo que nunca me faltou. Ele gostava da minha poesia, muito embora a "remendasse" (como dizia ele), com carinho e afeto didáticos e literários, para torná-la mais crítica e mais audaciosa.
Tenho em conta que, do muito que sei, veio-me por intermédio de José Nascimento de Moraes Filho.
Aceite meus pêsames pela morte dele.
Fraternalmente.
João Batista do Lago


Eis o teor do e-mail:

[© 2007 Joao Poeta do Brasil] Comentário: "Artigos"‏
De: José. N. M. Neto (donotreply@wordpress.com)
Enviada: sábado, 21 de fevereiro de 2009 23:22:46
Para: joaobatistalago@hotmail.com

Novo comentário sobre o seu post #221 "Artigos"Autor: José. N. M. Neto (IP: 189.81.18.9 , 18981018009.user.veloxzone.com.br)Email: lenamo@globomail.comURL : Whois : http://ws.arin.net/cgi-bin/whois.pl?queryinput=189.81.18.9Comentário:O poeta José N. Moraes Filho (15/07/1922 -21/02/2009) faleceu hoje na cidade de São Luís - Ma aos 86 anos, após uma rápida parada cárdio respiratória às 07:45 no Hospital UDI, S. Luís – centro. O poeta era cardiopata, mas mantinha-se com saúde estável. Hoje em sua residência às 07h00min da manhã ao acordar, sentiu um leve mal estar, sendo encaminhado ao hospital por familiares, faleceu no transcurso. Ao chegar ao hospital, submeteu-se aos procedimentos de rotina...sem retorno...! O velório acontece na sede da Pax União – centro. O enterro ocorrerá dia 22(domingo) às 10h00min da manhã no Cemitério do Gavião (centro). Em conversas familiares (referido por uma das filhas) ele queria morrer sem sofrimentos prolongados, em dia claro, ensolarado e festivo...Transcendental, católico, em sua linguagem quântica escreve em seus poemas como concebia vida e morte: "a luz projetou-me no infinitoe cosmovisionou-me até a origem das origens!e me vi gerar!... e me vi nascer!..- antes dos universos!Livre!...Livre!..." “... eu não nasci para mim!- nasci para a humanidade!...eu não nasci para aqui:- nasci para o universo!" Descanse em Paz poeta!Só o fato de ressuscitar a primeira romancista negra do Brasil, foi uma de suas maiores missões neste plano!Obrigado J. Batista pela homenagem em vida que prestastes ao poeta com a belíssima "METONÍMIA"!Atenciosamente,J. N. M. Neto. Você pode ver todos os comentários sobre esse post aqui:http://joaopoetadobrasil.wordpress.com/artigos/#comments Excluir: http://joaopoetadobrasil.wordpress.com/wp-admin/comment.php?action=cdc&c=242Marcar como spam: http://joaopoetadobrasil.wordpress.com/wp-admin/comment.php?action=cdc&dt=spam&c=242

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Este foi o poema que dediquei ao mestre Nascimento de Moraes (ainda em vida):

Metonímia

(Ao mestre José Nascimento de Moraes Filho,
poeta maranhense, espírito libertário do meu tempo,
que não cansa sua utopia de libertação.)


© DE João Batista do Lago

Uma voz metálica
sob a contemplação de João Lisboa
corta a barreira do vento para atingir
na outra margem da Ágora
os surdos ouvidos que
não desejam o verdejar da Ilha
que chora nas suas entranhas
a transfusão da lama vermelha.

O velho libertário
ainda que libelo solitário
quer vaticinar sua dor
num grito quase que terminal
como uma ferradura
entre os desilhados franco-luso-brasileiros
já quase derrotados em sua rebeldia
antes orgulhosa e cheia de galhardia.

A marca do tempo.
O tempo da marca.

Marca que ferroa o chão
de dor e de horror
Marca que impede ecoar
o grito parado na garganta:

alcooooooooooaaaaaaaaaa...
da alcova dos poderosos
não há de vingar nenhum descendente
apesar do tolo condescendente que te ama.

A metálica voz singra
e se faz ouvinte discurso...

No outro lado da praça
onde ouvidos moucos
- que desgraça!
antes filhos da rebeldia
hoje Narcisos “aluminados”
que iluminam o desencanto
da ilha que chora
o (quase!) derradeiro ato
ouvem
ainda que rouca pelo tempo
a voz metálica do velho libertário:

“Estarei sempre atento às tuas investidas
mesmo que isso me cause a morte
mas não te deixarei por sorte
a vantagem insana de me esculpires
na alma – com a tua lama –
a tua marca miserável de dor e fome”

A CONCHA E SUA IMENSIDÃO

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A CONCHA E SUA IMENSIDÃO

© DE João Batista do Lago

Da imensidão da concha

Recrio-me da pequenez

Invado minha floresta

À cata do rio mais limpo

Para garimpar a perolo negra

A mais sublime pedra

Gerada pela concha

Que só revela seus segredos

À sua imensa floresta

No interior da floresta

Guardada pelas águas dum rio livre

A concha jamais aborta suas pérolas

Ela recria-se com tanta imensidão

Deixa de ser pequena habitação

Para se tornar palácio de todas as pérolas

E ser o ventre de toda natureza

No movimento mais sublime da criação

Do molusco perfeito que se arrasta pelo chão

Assim é a imensidão da minha concha

Quando se lha tem guardada pela floresta e pelo rio

Não há nada mais sublime; e nem divino

Nada maior existe que sua própria dimensão

Pérola e molusco vagam a mesma floresta

E navegam no mesmo rio de águas livres

Rompendo rochedos; furando pedras

Abrindo caminhos com a força do furacão

Rasgando a imensidão da terra para nova habitação

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O CARNAVAL COMO CRIADOR E CRIATURA DE MITOS PESSOAIS E COLETIVOS

O CARNAVAL COMO CRIADOR E CRIATURA DE MITOS PESSOAIS E COLETIVOS

© DE João Batista do Lago

Oficialmente começa hoje[1], com o desfile das escolas de samba de São Paulo, o carnaval brasileiro, que, teoricamente, acabaria na segunda-feira, com o desfile do segundo dia das escolas de samba do Rio de Janeiro, ou oficialmente, na terça-feira de carnaval. Contudo, oficiosamente, o carnaval tem início uma semana antes e finda uma semana depois, em várias cidades brasileiras[2].

Em geral – seja no período carnavalesco, ou não –, nunca paramos para pensar sobre o “como?” e o “por quê?” essa manifestação folclórica se dá no Brasil com tanta e quanta intensidade. O carnaval não acontece só aqui. Mas, em nenhum outro lugar do mundo é tão festejado quanto no Brasil.

Muitas são as teorias e teses sobre a origem do carnaval. Evidentemente todas têm seu “cadinho” de verdade. De fato, tudo que os historiadores – sejam da corrente antropológica ou da corrente sociológica – descreveram e relataram, até aqui, são fatos históricos que não se podem duvidar, pois, nesse campo, paradoxalmente, as pesquisas são intensas e críveis.

Mas, aos meus olhos, ainda há uma linha de pesquisa, nesse campo, que mereceria ser mais pesquisada, estudada e analisada cientifico-fenomenologicamente, afora as pesquisas e estudos que são realizados pelos carnavalescos, que merecem o mais pleno respeito de todos nós, pois, aos trancos e barrancos, são pessoas que contam a “história do mundo” a partir de suas visões mitográficas. Como podem ver refiro-me ao campo mitológico; ao fenômeno do Mito, que se há introjetado no carnaval como Corpo, Alma e Espírito, isto é, que é imanente ao Homem (homem/mulher).

Se partirmos da idéia que o Homem é um “Sujeito” mitográfico, ou seja, que é refém da sua exposição ou descrição das fábulas ou mitos, aí então, compreender-se-á, por definitivo, o valor cultural do Carnaval. E quando infiro sobre o “valor cultural” quero dizer que “é” parte da natureza do Homem. E quando assumo essa inferição como verdade quero fazer crer que não estão certos os que veem no carnaval apenas e tão somente o malogro que muitas vezes se perjura contra ele (o carnaval).

Em “O Mundo como Vontade e Representação”, Arthur Schopenhauer (1788 – 1860), descortina que “o mundo é a minha representação: eis uma verdade que vale para cada ser vivente e cognoscitivo, mesmo se somente o homem é capaz de acolhê-la na sua consciência reflexa e abstrata (...) Torna-se claro e certo para ele que não conhece nem o Sol nem a terra, mas possui um olho que vê o Sol, a mão que sente a terra; que o mundo que o circunda não existe senão como representação – vale dizer – sempre e somente em relação a um outro, àquele que o representa, que é ele mesmo”.

S., evidentemente, não conhecera o carnaval do Brasil, contudo dá-me a nítida impressão (eis aqui a representação empírica da minha mente pessoal) que sua linguagem fora produzida para dialogar com a linguagem do carnavalesco brasileiro. Toda consciência que sabemos do mundo, mesmo como consciência epistemológica, é que tudo não passa de fenômeno. Assim sendo, tudo é aparência, ilusão ou fantasia. Ao final, não é exatamente isso que assistimos no carnaval? Pois sim! O carnaval, assim, é a representação da nossa mente coletivo-pessoal, ou seja, pelos olhos dos carnavalescos representamos – e nos representamos, paradoxalmente! – em cada aparência, em cada ilusão, em cada fantasia, que se nos permite desenhar no mapa da nossa mente pessoal, e coletiva, uma realidade que não é real.

O carnaval é, no mesmo instante em que o vivenciamos – seja presencialmente; seja pelos meios de comunicação –, espaço e tempo de nossas configurações de extensionalidade, ou seja, é o espaço onde nos permitimos sair da concha para nos extrapolar, isto é, para nos multiplicar “n” vezes em nós mesmos – seja no plano pessoal; seja no plano social. E isto tem a ver com o nosso campo mitográfico, na medida em que somos o criador e a criatura dos nossos mitos mais profundos e individualizados, pessoal e coletivamente.

Gaston Bachelard (1884 – 1962) nos ensina que “(...) embora pareça paradoxal, muitas vezes é essa imensidão interior que dá seu verdadeiro significado a certas expressões referentes ao mundo que vive (...)”. Exemplificando ele toma a imensidão da Floresta para nos dizer que “(...) essa ‘imensidão’ nasce de um corpo de impressões que não derivam realmente de ensinamentos (...); não é preciso permanecer muito tempo nos bosques para conhecer a impressão sempre um pouco ansiosa de que ‘mergulhamos’ num mundo sem limites (...)”.

Porventura não é exatamente o que ocorre com o carnaval brasileiro? Pois sim! Mergulhamos profundamente em nossas florestas pessoal-coletivas, revisitando nossas aparências, nossos sonhos e nossas fantasias. E é exatamente nesse espaço, nessa floresta de-si, num tempo marcado pelo real, que vamos à busca de nossas realidades imaginadas, como criadores e criaturas de nossos mitos. E, paradoxalmente, renascemos como a Fênix (mito) para o enfrentamento do real, feito do concreto real, que se nos apresentará no momento seguinte em cada infraestrutura da nossa geografia de vida.

Bom carnaval a todos.



[1] 20 de fevereiro de 2009

[2] Cidades como São Luis, Salvador, Natal, Olinda..., por exemplo, dão início ao período momesco uma semana antes e terminam uma semana depois. Em muitos casos – seja antes ou depois – o período carnavalesco é mais longo.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

3 POEMAS INÉDITOS

INAUDITA

© DE João Batista do Lago

Triste o engano da minha palavra!

Ela pensa que fala, mas não diz nada;

Coloca-se no altar como sagrada (e)

Submete ao fiel idólatra sedento de sentido

Toda miséria enclausurada no ser...

Se a palavra soubesse ficaria calada (e)

Deixaria nela a esperança renascer

Plena de sentido na imagem que fala

Como linguagem que não se cala;

Como água pura que jorra do meu poço fundo.

Porém, insiste a palavra, eterna incauta,

Ser do pensamento a razão pura;

Tola criança! Tropega seus primeiros passos...

E diante do templo do ser fica sem espaço

Não sabe de si qualquer imagem; é pura miragem!

Jamais chegará à essência como linguagem.

__________

SONHO

© DE João Batista do Lago

Ontem sonhei com a minha morte!

Jamais vivi tamanha sensação

Deste lado de cá.

Pena foi só um sonho:

Tristonho, agora me encontro.

Embalsamado pela vida

Que, vai minhas feridas

Ferindo pela eternidade.

Lá, depois de morto,

Toda paz fazia do meu corpo

A aura que me guiava

Por entre arvoredos de felicidades.

Agora,

Choro a infelicidade de

Todas as dores...

Do lado de cá não há arvoredos,

Só os degredos

Guiam minha carruagem

Que não encontra

A porta da passagem

Para a eternidade...

Ah!

Como seria bom

Se a morte me abrandasse

Todas as noites,

Que me morresse num

Abraço de eterna felicidade!

.......................................

Hoje à noite estarei pronto para a morte.

__________

INTUIÇÕES DO INSTANTE

© DE João Batista do Lago

Canto minha doçura

Serena e leve

Como a brisa

Do mar que me habita

Na insensatez da vida

Querida

Por ser miséria

Que aniquila minha vida

De torpeza alegre[no vazio do q

Não sei dizer

Nem de mim[nem de ti

Amo

Desamo

Bebo

Desbebo

Como

Descomo

...

e assim me vou

como o frete

mal pago

do dízimo

que nunca me alcançou

cobrado

nas latrinas

das igrejas

onde eu-cristo

sou

diária [mente] crucificado

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Responses to “A POESIA – De Platão a Ayres Britto”, in JOAO POETA DO BRASIL

http://joaopoetadobrasil.wordpress.com




Brilhante esta análise de João Batista Gomes do Lago, ilustre poeta, jornalista e cronista maranhense, na qual se mostra inconformado com a simples retransmissão, repetição ipsis literis das palavras do ministro do Supremo Tribunal Ayres de Britto, sem que tenha havido uma digestão de suas palavras.
“Incompetência, indiferença e omissão” não multiplicam, fecundam pensamentos. Como podem os “atores-sujeitos” aos quais se referiu João Batista lerem nas entrelinhas, ressignificarem a frase do Sr. Ministro se lhes falta o conteúdo individual e social de uma paidéia, se a formação dos cidadãos é relegada a segundo plano nas três esferas? Não é de se admirar que faltem argumentos para um comentário crítico, fecundo, multiplicador…
Platão definiu Paidéia como “a essência de toda a verdadeira educação(…), é a que dá ao homem o desejo e a ânsia de se tornar um cidadão perfeito e o ensina a mandar e a obedecer, tendo a justiça como fundamento”.
O que é muito interessante na leitura que João fez das palavras do ministro é a referência a um dos Diálogos de Platão (A República). O juiz, de seu alto posto, ao propor a Poesia, socratiza Platão ao incitar que governem juntos os “poetas” e os “sábios” (para Platão os poetas deveriam ser mantidos à parte do governo, pois como loucos, não se prestavam a tão grande responsabilidade). Ao lado “estável” e inalcançável das idéias platônicas, Ayres propõe a fluidez e o intercâmbio de um Heráclito, quase uma maiêutica a interrogar o status do juiz. Diz para um Platão teórico que ao mais sábio, à Sabedoria deve-se unir a Beleza, a sensibilidade para que se persiga o ideal da Justiça; para que se diga o Direito (a palavra juiz vem do latim iudex, aquele que julga e deriva de ius, direito e dicere, dizer) é urgente e condição necessária a inserção no contexto social, real de cada postulante.
O ministro Ayres, um humanista, é um ardoroso defensor de um pensar dialético da realidade do direito, da prestação jurisdicional justa, imparcial, consciente e célere. São suas as palavras “Não sou ácaro de processo, sou um ser de vida. Abro a janela do Direito para a vida”.
Consciente do papel dos magistrados, da responsabilidade de um bem julgar pessoal e instransferível, da responsabilidade embutida em cada sentença, Ayres vê na jurisprudência um instrumento de reforma sócio-jurídica, donde sua preocupação com a formação dos jovens juízes.
Propõe-lhes que, paralelamente à formação acadêmica, cultivem a sensibilidade (Poesia), ilustrem-se e sonhem também com textos não jurídicos (Romances), mergulhem nas mazelas sociais e conheçam a sociedade (Jornais), tenham consciência do seu papel de significantes - “não vazios” -, como bem disse João (o signo linguístico juiz compõe-se de um significado -um conceito - e um significante - uma imagem acústica ou gráfica).
Em perfeita sintonia com o pensar de Ayres, João propõe, como se o magistrado a falar, que a “superioridade” do pensar “poético” não deve estar associada ao status social ou à arrogância, prepotência demiúrgica dos que se acreditam donos do Direito, ao dizê-lo. É indispensável que a superioridade advenha da formação paidética, essa a única a conceder a licença a ele outorgada pela convicção, pela constatação dos seus pares…
João Batista termina sua análise das palavras do ministro com uma poesia…e que poesia…Como é difícil analisar o pensamento complexo de João! São-nos permitidos apenas alguns recortes devido à profundidade dos termos que insere. Pareceu-me que, nesta poesia, ele colocou no seu cadinho de idéias seu lado filósofo, cercado da mitologia e arquétipos gregos, para expor um profundo desencantamento, uma frustração com aqueles que alçou ao status de deuses…Desce-os do pedestal e ensimesmado, pergunta-se porque os colocou lá…
Tal como os gregos antigos, quando em suas viagens marítimas se aperceberam de que seus seres mitológicos nem existiam, nem habitaram os locais que imaginavam, o poeta João sente que seus “deuses”, por trás da persona, são homens…e se desencanta com eles, por tê-los elevado ao cume do Olimpo que, visto de perto não carrega vestígios arqueológicos de deus nenhum…
O poeta João se apercebe de sua responsabilidade na criação de um deus, um mito perfeito - e por isso, digladiam-se os deuses, cópias humanas de sua imperfeição. Carregam-lhe os traços de imperfeição que seu Criador possui…
O criador de um deus deve alimentá-lo com o alimento que o torna perfeito e esse, o João não tem para ofertar, pois que humano é…Daí, sua angústia em descobrir-se de “espada em riste” a defender abstrações de um nada…
Ao mesmo tempo, o poeta renega esses deuses tão lhe assemelhados que convivem no seu âmago, encarcera-os em seu subconsciente como para lembrar-se do “lado sombra” de si mesmo…E, mais uma vez, como analista de si mesmo, tenta entendê-los e vencê-los com o golpe da razão, e espalha dúvidas ao seu poder com as sementes (diálogos) que planta em si e no outro (o campo seminal).
Termina magistralmente, qual juiz, a comparar a angústia de olhar seus mitos (leia-se dirigentes, governo, homens que mitificamos) ao suplício de Prometeu . Tal qual este,”roubou” dos deuses o “fogo” do discernimento e, viu-lhes o segredo que estava em si mesmo! Por isso, sofre por co-responsabilidade. Mas agora, sacrílego consciente, Édipo às avessas, apodera-se da esperança que guarda Pandora e, é nela que antevê uma promessa de organização. Afinal, na amorficidade do Caos (leia-se na confusão das idéias, na arguição, nos porquês, na crítica, no cair de vendas) está implícita a característica fecundante, criadora…
Como em toda poesia, é impossível interpretar completamente, dissecar o pensamento do poeta. Mesmo este, ao relê-la, nela verá novas nuances que não tinha se apercebido. Esta é uma característica das poesias e dos poetas - serem humanos numa hora e deuses noutra…Para se compreendê-los é preciso ser o mesmo…Sou apenas humana…

Leninha